segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Sobre a internet e o que há de melhor e pior em nós



A internet é um território habitado por seres de variados tipos. Embora todos, aparentemente,  pertençam a uma única espécie, a humana,  seus gostos, o modo como se comportam, o que compartilham, os nichos nos quais se inserem, são evidências incontestáveis dessa heterogeneidade. Não há como negar, pelo menos por aqueles que estão conectados, que é um espaço democrático. Tão democrático que comporta, e suporta, posições radicais,  tiranias e fundamentalismos, do mesmo modo que difunde ideais de paz, amor e  tolerância. Em 2011, ela teve um papel realmente significativo. Foi o principal veículo de denúncias e, o mais importante, uma parcela relevante da população não ficou passiva diante delas. Usando particularmente as redes sociais, mobilizou-se contra a corrupção, contra o sistema econômico injusto, em defesa dos animais, da liberdade e de uma série de outras causas importantes. Revoluções foram feitas, líderes caíram e instaurou-se um clima de expectativa em relação ao que está por vir.
Apesar de considerar o saldo positivo,  é preciso levar em conta também os aspectos negativos. O fato de ser um território relativamente livre, dá margem para que não poucas pessoas exponham também seus sentimentos mais mesquinhos, seus anseios fúteis, sua superficialidade e, principalmente, uma animosidade gratuita. Todos se tornam vítimas da “trollação”. São críticas sem fundamento, cujo único objetivo  é deixar mal aqueles a quem são direcionadas, numa tentativa constante de se sentir superior diante dos supostos defeitos ou fraquezas alheias.  Assim, magros e “sarados” reivindicam sua supremacia  detonando todos que não se encaixam neste padrão. Os jovens vilipendiam a maturidade dos mais velhos. Os que se julgam inteligentes, por ter um curso superior, humilham aqueles que ignoram as regras da gramática.  As celebridades desmistificadas também “trollam” e são “trolladas”. O caso de Ed Motta no facebook é emblemático. Ficou mais que claro seu preconceito de origem e social, e sua tendência misógina no comentário que fez sobre Paula Toller. Segundo ele, ela não tem talento, mas é bonita. Em outras palavras, isso a torna  suportável.
Confesso que, diante disso, sinto alguns temores. Visito blogs, sites de notícias e participo de  redes sociais. A impressão que tenho é que essas pessoas amarguradas, vazias, mal-intencionadas e intolerantes são onipresentes. Não acredito que sejam a maioria, mas penso que fazem mais barulho. Não se intimidam perante nada. Meu maior receio é que, pela insistência,  consigam inculcar em nós o cinismo, no sentido contemporâneo do conceito, não no sentido filosófico. Ou seja, que acreditemos que as coisas são assim porque são e não adianta fazer nada. Isso,  definitivamente, não é verdade. Precisamos continuar defendendo causas justas, sem agressividade, sem desrespeito, mas com muita tenacidade.  Ainda que pareça uma visão maniqueísta, devo esclarecer que não é. Tenho ciência de que o  mesmo que incorpora a  personalidade de “troll” na net,  pode ser, longe do teclado, o  bom vizinho, o bom amigo, o bom filho. O que não podemos é deixar que, por meio da rede, o pior que há em nós leve vantagem e nos domine.  Até mesmo neste universo de avatares,  o bem-estar de cada um está intimamente ligado ao bem-estar do outro.  E vale sempre lembrar que o  limite das grandes revoluções que visam melhorar o mundo é dado pela nossa indisposição de melhorarmos a nós mesmos.