quarta-feira, 15 de abril de 2009

Sociedade contemporânea: medo, individualização e a possibilidade de uma práxis comunicativa





A sociedade contemporânea caracteriza-se por uma complexidade "sui generis", decorrente, sobretudo, da acentuação do dinamismo próprio do processo de modernização. Se os clássicos da sociologia tomaram para si a tarefa de explicar e/ou interpretar um mundo no qual prevalecia, de modo geral, a crença de que a sociedade evoluía para um estágio avançado de organização social, os contemporâneos têm a missão de trazer luz sobre os rumos incertos de uma civilização para a qual o futuro é uma obscuridade.
Zygmunt Bauman, para caracterizar a civilização moderna e globalizada que privilegia alguns e exclui milhões, põe em destaque o medo. Ao perder sua fé no potencial da ciência de construir um mundo mais seguro e mais feliz, o indivíduo vê-se à deriva no processo histórico. Sente-se vulnerável perante as muitas ameaças que a caótica realidade social contemporânea apresenta. A possibilidade da violência, da solidão, das epidemias, da exclusão social, produz ansiedades típicas do nosso tempo. O mundo, descrito pelo autor, é o mundo das coisas fora do lugar. Em sua visão, não é como se a lei e a ordem entrassem em colapso, mas é “como se nunca tivessem existido”.
As certezas próprias da modernidade sólida/pesada evaporaram-se na modernidade líquida/leve. O insucesso dos grandes projetos da iluminada comovisão moderna redundou numa sempre crescente individualização. Sobre o homem de hoje, Bauman (2001) assinala que, “Nas novas circunstâncias, o mais provável é que a maior parte da vida humana e a maioria das vidas humanas consuma-se na agonia quanto às escolhas e objetivos.”
Impulsionando o processo de individualização está o capitalismo de consumo. É através do consumo que os sujeitos constroem sua individualidade e, por conseguinte, manifestam sua condição de seres livres. No entanto, tal liberdade se torna relativa, já que o próprio consumo lhe impõe limites, no sentido de que, a permissão para consumir não é concedida a todas as pessoas indiscriminadamente. E aos que tem permissão, é o mercado que determina tanto as necessidades quanto os produtos para satisfazê-las, como assinalam Adorno e Horkheimer na 'Dialética do Esclarecimento'.
Sob o ponto de vista de Jürgen Habermas, o século XXI desponta trazendo consigo o peso da crise do estado de bem-estar social e do esgotamento das energias utópicas. A nova situação, segundo ele, resulta do fato de que o programa do Estado, que alimentava-se, recorrentemente da utopia de uma sociedade do trabalho, não consegue mais construir possibilidades futuras de uma vida coletivamente melhor e menos ameaçada. Assim, o autor faz uma análise do mundo contemporâneo pondo em evidência a insegurança resultante do temor de um futuro que se mostra ameaçador.
Contudo, a descrição habersiana não se encerra na perspectiva negativa aqui apresentada. O autor faz questão de mostrar que, embora o quadro seja sombrio, o atual contexto traz em si as condições necessárias para “uma práxis comunicativa cotidiana e para um processo de formação discursiva da vontade, as quais poderiam criar as condições para os próprios participantes - segundo as necessidades e idéias próprias e por iniciativa própria – possibilidades concretas de uma vida melhor e menos ameaçada.”
Nesse sentido, a construção de uma sociedade mais livre e igualitária depende basicamente da suplantação da razão instrumental, própria da modernidade - cujo propósito é controlar a natureza e subjugar o outro - por uma razão comunicativa, que poderia levar a humanidade a uma etapa de convivência mais pacífica e, por conseguinte, menos perigosa.